O Elevador do Batman 

Um amigo me contou uma história que achei interessante, de forma que resolvi compartilhá-la. 

Para preservarmos sua imagem, vamos chamá-lo de Arnaldo. 

Há algum tempo ele precisou trocar de apartamento, e viu vários antes de decidir. 

Um deles era interessante, mas era no décimo andar. Ele ficou um pouco decepcionado ao descobrir as coordenadas exatas do local, pois iria justamente se mudar de uma cobertura que o decepcionou. 

Cobertura, como o próprio nome já diz, subentende a existência de um andar em cima e um em baixo. Separando os dois normalmente há uma escada, já que os serem humanos ainda não dominam o conhecimento para sair voando. Teletransportar-se seria outra opção, mas nenhum filme de ficção científica ensinou como fazê-lo. 

Qualquer ser humano normal teria usado a escada e nem gastaria 2 minutos pensando a respeito. 

Mas Arnaldo não era um ser humano normal. Ao menos hoje em dia. Seu joelho, velho de guerra como o meu, tinha deixado boa parte da cartilagem no caminho. Assim sendo, o joelho fazia “crec-crec” cada vez que subia e descia a escada, onomatopeia compartilhada por qualquer mordida em junk food industrializado na seção de salgadinhos.  

Era “crec-crec” pra cá, “crec-crec” pra lá, uma inexplicável vontade de comer salgadinho industrializado, até que meu amigo cansou. As idas e vindas de escada já não mais compensavam a dor, de forma que só se usava o andar de baixo do apartamento. O andar de cima ficava lá, largado, cheio de pó e triste, ocupado apenas por um ou outro inseto que se aventurava no local. 

Dessa forma, Arnaldo recebeu com reticências a notícia de que o apartamento ficava no 10º andar: 

- Não sei se esse é pra mim. Seria muito ruim ter que subir de escadas no dia em que faltar luz. 

- Nada, meu amigo! Não é assim, não! – disse o corretor de imóveis.  

Tenho sérias dúvidas se ele era realmente amigo do meu amigo. O corretor continuou sua justificativa: 

- Aqui no prédio você terá 2 elevadores, não somente 1. Além disso, na eventualidade de faltar luz, temos um gerador na garagem, que faz com que o elevador não pare nunca! 

- Sério? Não tem erro? 

- Zero chance! Pode ficar tranquilo. Esse elevador aqui é o do Batman! Não para nunca de funcionar! 

Aqui o corretor usou uma imagem bem curiosa. Não lembro do Batman indo para a bat-caverna esperando um bat-elevador. Ainda assim, a expressão ficou no imaginário do meu amigo, garantindo assim uma grande sensação de segurança.  

Confiante no elevador do Batman, Arnaldo alugou o apartamento com tranquilidade.  

Com menos de 2 meses dentro do imóvel, meu amigo começou a perceber que algo não cheirava bem. E o cheiro vinha de dentro do elevador. 

Constantemente 1 dos aparelhos dava defeito, muitas vezes deixando seus companheiros de prédio presos na máquina, por defeito técnico. 

Com alguma frequência o de serviço ficava enciumado com a atenção recebida pelo social e resolvia falhar também.  

Os técnicos das máquinas iam no prédio com tanta frequência que já chamavam os moradores pelo nome. 

Meu amigo chegou a me questionar em relação a alguma maracutaia entre a empresa de suporte técnico e a administradora do condomínio, levantando dúvida sobre a lisura dos profissionais. 

- Não sei, Arnaldo, eu não tenho como opinar. 

- Decerto que esse não é o elevador do Batman! 

- Não... Só se essa versão do Batman estivesse com sérias restrições orçamentárias. 

O fato é que algum tempo se passou – nem tanto tempo assim – e Arnaldo me reportou o fatídico episódio: somente o elevador de serviço funcionava quando faltou luz. Ele teve que pegar os 11 andares de escada, pra cima e pra baixo, e a situação persistiu por algumas horas. 

Passado o rebuliço, ele perguntou por que o gerador não saiu do banco de reservas, assinou a súmula e entrou em campo na sua deixa. O porteiro foi enfático: 

- É que o gerador só funciona com o elevador social. 

Resumo da ópera (ou to make a long story short, em homenagem à recomendação cultural): não adiantou nada tirar onda citando o paladino da justiça: na hora do aperto, Batman teve que pegar as escadas com pressa. E tomando cuidado para não pisar em cima da capa e tropeçar.  

A sensação de segurança aqui era só aparente. Nem sempre estamos seguros quando cremos que estamos seguros. 

No mercado financeiro, muita gente concentra demais a sua carteira com uma confiança de que sabe tudo em relação às teses; as vezes é alguém que já junta dinheiro há mais de uma década! E mesmo assim sofre um grande revés financeiro, não raro perdendo 20% ou mais do seu patrimônio. 

Por mais que você saiba, há coisas que você não sabe que você não sabe. 

Imagine que pode haver fraude contábil, uma tragédia como uma covid até mais persistente ou mesmo uma disrupção que acabe com o setor de uma hora pra outra. 

A diversificação salva! 

Aquele que fica com pressa pra acumular patrimônio como o Bruce Wayne acaba quebrado como o Homem Crediário.